DEFESA PREVIA DROGAS
- ADVOGADO CRIMINAL
- 7 de abr. de 2020
- 6 min de leitura
EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUÍZA DE DIREITO DA VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL DA COMARCA DE SANTOS/SP.
PROCESSO DIGITAL:
NOME, já qualificado nos autos do processo em epígrafe vem, com todo respeito e acatamento à presença de Vossa Excelência por seu Advogado, nomeado pelo Convênio OAB/DPE (Dativo) responder por escrito à acusação com incurso no artigo 28 da lei 11.343/06.
DOS FATOS.
O denunciado está sendo imputado o crime previsto no artigo 28 da Lei de Drogas. Segundo consta da inicial acusatória, por volta 16 Horas, do dia 28 de junho de 2017, na rua Décio Stuart, numero 10, Bairro José Menino, o acusado foi surpreendido por policiais, trazendo consigo uma pedra de Crack.
A Denúncia foi recebida dos autos, apoiando-se nos depoimentos dos milicianos que abordaram o acusado na via pública.
Por fim o acusado afirmou que as drogas eram suas evidenciando, diante das circunstâncias o destino para o consumo pessoal.
DA FALTA DE JUSTA CAUSA – INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 28 DA LEI 11343/06.
Preliminarmente, deve ter lugar a consciência de que a conduta prevista hoje pelo artigo 28 da lei 11343/06 NÃO REPRESENTA CRIME, uma vez que não há ofensa ao bem jurídico que supostamente visa proteger, que seja, a saúde pública.
Neste sentido, está o posicionamento de MARIA LÚCIA KARAM (De crimes, penas e fantasias, p. 126), ao dizer que:
"é evidente que na conduta de uma pessoa, que, destinando-a a seu próprio uso, adquire ou tem a posse de uma substância, que causa ou pode causar mal à saúde, não há como identificar ofensa à saúde pública, dada ausência daquela expansibilidade do perigo (...). Nesta linha de raciocínio, não há como negar/incompatibilidade entre a aquisição ou posse de drogas para uso pessoal - não importa em que quantidade - e a ofensa à saúde pública, pois não há como negar que a expansibilidade do perigo e a destinação individual são antagônicas. A destinação pessoal não se compatibiliza com o perigo para interesses jurídicos alheios. São coisas conceitualmente antagônicas: ter algo para difundir entre terceiros, sendo totalmente fora de lógica sustentar que a proteção à saúde pública envolve a punição da posse de drogas para uso pessoal".
Ademais, a previsão da posse de entorpecentes para consumo próprio tem de ser encarada como ofensiva ao princípio constitucional da igualdade, vez que trata de forma diferente usuários de substâncias entorpecentes lícitas e ilícitas, as quais causam igualmente vínculos de dependência.
É o que afirma o estudioso SALO DE CARVALHO (A política criminal de drogas no Brasil. Estudo criminológico e dogmático, Editora Lumem Júris, RJ, 2007, p. 253), ao expor que a lei faz:
"distinção de tratamento penal (drogas ilícitas) e não-penal (drogas lícitas) para usuários de diferentes substâncias, tendo ambas potencialidade de determinar dependência física e psíquica”.
Não apenas a doutrina enxerga a questão pelo viés descriminalizador, o próprio Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo emitiu decisão recente no sentido da descriminalização da posse de entorpecentes para consumo próprio:
EMENTA: 1.- A traficância exige prova concreta, não sendo suficientes, para a comprovação da mercancia, denúncias anônimas de que o acusado seria um traficante. 2.- O artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é inconstitucional. A criminalização primária do porte de entorpecentes para uso próprio é de indisfarçável insustentabilidade jurídico-penal, porque não há tipificação de conduta hábil a produzir lesão que invada os limites da alteridade, afronta os princípios da igualdade, da inviolabilidade da intimidade e da vida privada e do respeito à diferença, corolário do princípio da dignidade, albergados pela Constituição Federal e por tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil. (TJ/SP, Ap.Cr. nº. 01113563.3/0-0000-000, São José do Rio Pardo, 6ª Cam. C do 3º Grupo Sec. Crim., Rel. José Henrique Rodrigues Torres).
A recente discussão sobre o crime em comento, pelo Supremo Tribunal Federal, por mais que ainda não decisivo, já deve ser considerada como parâmetro para as decisões nesse sentido, pois, uma vez que o próprio Supremo está em discussão sobre tal assunto é relevante entender que ainda é um assunto controverso e polêmico passível de alterações.
O ministro Gilmar Mendes é o Relator do processo, em que foi encontrado no interior de uma cela 0,3 gramas de maconha onde o detento Francisco Benedito de Souza assume a posse da droga para consumo próprio.
Neste sentido, foi seu voto.
“O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator do Recurso Extraordinário (RE) 635659, com repercussão geral reconhecida, votou pela inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que define como crime a porte de drogas para uso pessoal. Segundo o entendimento adotado pelo ministro, a criminalização estigmatiza o usuário e compromete medidas de prevenção e redução de danos. Destacou também que se trata de uma punição desproporcional do usuário, ineficaz no combate às drogas, além de infligir o direito constitucional à personalidade. (www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=298109&caixaBusca=N#)
Nesta toada, deve ter lugar a consciência de que a conduta prevista hoje pelo artigo 28 da lei 11.343/076 não representa crime, uma vez que não há ofensa ao bem jurídico que supostamente visa a proteger, qual seja a saúde pública.
Desta forma, Excelência, sendo inconstitucional o artigo 28 da Lei 11.343/06, conforme justamente aponta o precedente jurisprudencial citado acima, a conduta prevista é atípica, razão pela qual deve o réu deve ser absolvido por faltar provas, contudo, caso Vossa Excelência assim não entenda, melhor sorte socorre o Denunciado nos argumentos abaixo.
Destaca-se, também, ilustres julgadores que a quantidade apreendida é de pequeno porte, ou seja, trata-se de uma pequena quantidade para uso, desta forma, pela própria leitura da exordial e das provas constantes nos autos, “data vênia”, é de rigor o reconhecimento da atipicidade da conduta ante a sua insignificância.
A norma penal incriminadora tem a sua razão de ser na proteção de um bem jurídico, excluindo de seu âmbito de proibição as condutas que não afetam o bem juridicamente tutelado.
Cabe destacar o princípio da PROPORCIONALIDADE, onde a droga, diga-se de passagem, de pequeno valor, portanto, a consequência natural da aplicação do critério da insignificância (como critério de interpretação restritiva dos tipos penais – assim sustentava Welzel - ou mesmo como causa de exclusão da tipicidade material – STF, HC 84.412, rel. Min. Celso de Mello), consiste na exclusão da responsabilidade penal dos fatos ofensivos de pouca importância ou de ínfima lesividade.
São fatos materialmente atípicos (afasta-se a tipicidade material, pouco importando se trata da insignificância da conduta ou do resultado).
Portanto, Excelência, não há dúvida que, por força do princípio da insignificância, o fato mínimo ou de ínfimo significado é atípico, seja porque não há desaprovação da conduta (conduta insignificante), seja porque não há um resultado jurídico valioso (resultado ínfimo).
Podemos citar sobre a mais adequada consequência dogmática do princípio da insignificância (exclusão da tipicidade material) paradigmático é o HC 84.412-SP do STF (rel. Min. Celso de Mello).
A afetação insignificante, portanto, exclui a tipicidade, devendo ser estabelecida através da consideração conglobada da norma, ou seja, a insignificância surge à luz da finalidade geral que dá sentido à ordem normativa, não podendo ser estabelecida de uma consideração isolada da norma.
Inclusive em matéria de entorpecentes, apesar das divergências (que continuam), são numerosas as decisões do Superior Tribunal de Justiça reconhecendo o princípio da insignificância:
“Entorpecente. Quantidade ínfima. Atipicidade. O crime, além da conduta, reclama um resultado no sentido de causar dano ou perigo ao bem jurídico (...); a quantidade ínfima informada na denúncia não projeta o perigo reclamado”.1 Sempre “é importante demonstrar-se que a substância tinha a possibilidade para afetar ao bem jurídico tutelado”.2 A pena deve ser “necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do delito. Quando a conduta não seja reprovável, sempre e quando a pena não seja necessária, o juiz pode deixar de aplicar dita pena. O Direito penal moderno não é um puro raciocínio de lógica formal. É necessário considerar o sentido humanístico da norma jurídica. Toda lei tem um sentido teleológico. A pena conta com utilidade”.3 “Trancamento de ação penal, crime, porte de entorpecente, maconha, pequena quantidade, inexistencia, dano, perigo, saúde publica, aplicação, principio da insignificancia. (voto vencido) (min. Paulo Gallotti) descabimento, trancamento de ação penal, crime, porte de entorpecente, maconha, uso proprio, hipotese, consumo, praça publica, irrelevancia, pequena quantidade, caracterização, tipo penal, perigo abstrato, violação, saude publica.” (STJ, HC 21672-RJ, Rel. Min. Fontes de Alencar).
“Penal. Entorpecentes. Princípio da insignificância. - sendo ínfima a pequena quantidade de droga encontrada em poder do réu, o fato não tem repercussão na seara penal, à míngua de efetiva lesão do bem jurídico tutelado, enquadrando-se a hipótese no princípio da insignificância - habeas corpus concedido. (STJ, HC 17956-SP, rel. Min. Vicente Leal).
Desta forma, Excelência, sendo inconstitucional o artigo 28 da Lei 11.343/06, conforme justamente aponta os precedentes jurisprudenciais, a conduta prevista é atípica, razão pela qual deve o DENUNCIADO MICHAEL SWALO DE OLIVEIRA ser ABSOLVIDO.
DOS PEDIDOS.
Diante do exposto, requer digne-se Vossa Excelência em decretar:
A. Que seja o acusado absolvido pela atipiciade da conduta, nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, pelos motivos de fato e de direito aqui expostos.
B. A devida Certidão dos Honorários do Convênio OAB/DPE em seu teto máximo.
Nestes Termos,
P. Deferimento.
Santos, data do protocolo.
Assinatura Digital – Margem Direita.
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